Empossado nesta semana, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou uma série de medidas que terão impactos internacionalmente e nacionalmente.A reportagem ouviu especialistas e setores da economia que apontaram oportunidades e riscos para o Espírito Santo. Analista de Risco Político e coordenador dos cursos de Relações Internacionais e Comércio Exterior da UVV, Daniel Carvalho, citou medidas econômicas de Trump que representam um desafio significativo para a economia brasileira, especialmente para estados como o Espírito Santo, cuja relação comercial com os EUA é essencial.Ele dividiu as recentes medidas econômicas em duas áreas principais: tarifas sobre produtos estrangeiros e política fiscal expansionista e valorização do dólar.“O impacto dessas medidas protecionistas pode ser analisado sob dois aspectos. Primeiro, Trump reconhece o poder econômico dos EUA e utiliza ameaças como estratégia para obter vantagens em futuras negociações comerciais”.O segundo ponto é que caso os produtos brasileiros percam competitividade no mercado americano e não encontrem outros mercados estrangeiros, eles podem ser direcionados ao mercado interno, aumentando a oferta no Brasil e pressionando os preços para baixo. “Contudo, é improvável que a perda de competitividade seja tão significativa ou que não haja demanda em outros mercados. Paralelamente, a política fiscal expansionista prometida por Trump tende a valorizar o dólar. O governo busca compensar a balança de pagamentos com medidas como o ‘serviço de coleta externa’ e a taxação de remessas de dólares para outros países”. Essas ações aumentariam a demanda e a disponibilidade de dólares nos EUA, mas reduziriam a oferta da moeda no mercado global, tornando o dólar mais caro. Assim, para países com comércio exterior altamente dependente do dólar, como o Brasil, essa valorização tende a provocar pressões inflacionárias devido ao aumento do custo das importações.“Os EUA são o principal destino das exportações capixabas. Em 2024, 28,6% das exportações do Estado tiveram como destino os EUA, totalizando cerca de USD 3,07 bilhões, valor 4,5 vezes maior do que o exportado para a Malásia e 7 vezes maior do que o exportado para a China (respectivamente, 2º e 5º principais destinos das exportações capixabas), segundo dados do Comex Stat”.Já Bruno Maciel Santos, doutor em Relações Internacionais pela PUC-MG, destaca que com um dólar valorizado, viagens ao exterior ficam mais caras para brasileiros. “Isso pode impulsionar o turismo doméstico, beneficiando destinos capixabas”.
Donald Trump anunciou uma série de medidas que terão impactos internacionalmente e nacionalmente
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JULIA DEMAREE NIKHINSON/ASSOCIATED PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
AS PREVISÕESPossíveis impactosÀ pedido da reportagem, Bruno Maciel Santos, que é doutor em Relações Internacionais pela PUC-MG e professor de Análise de Política Externa do curso de Relações Internacionais da UVV, falou sobre possíveis impactos negativos e positivos do novo governo Donald Trump para o Espírito Santo.Para ele, a reeleição de Trump pode afetar a economia do Espírito Santo de várias maneiras, tanto positiva quanto negativamente, especialmente devido às políticas econômicas, comerciais e ambientais que ele pretende adotar. Acordo de Paris Uma das primeiras medidas adotadas foi a retirada dos EUA do Acordo de Paris que trata das mudanças climáticas. Com isso, Trump sinaliza que a agenda ambiental não será prioridade em seu governo, e que setores mais poluentes ganharão força na economia estadunidense. Juntamente com essa medida, o novo presidente decreta emergência energética nacional, com o objetivo de ampliar a produção doméstica de petróleo e gás.A medida busca combater a inflação e inclui autorizações para novas perfurações no Alasca e no Oceano Ártico. Essas medidas podem levar à queda do preço internacional do petróleo, afetando a arrecadação da Petrobrás e dos royalties do Estado.Política comercial Com relação à política comercial, Trump já assinou o Memorando de Política Comercial “América Primeiro” (America First Trade Policy Memorandum), que abre espaço para a possível imposição de tarifas comerciais mais altas para diversos países, com destaque para China e demais membros dos BRICS. Buscando manter a hegemonia do dólar como a moeda global, Trump ameaçou impor 100% de tarifas de importação caso os países dos BRICS reduzam a utilização do dólar em suas transações comerciais. Além disso, o memorando instrui o Representante de Comércio dos EUA a rever medidas antidumping e compensatórias, assim como avaliar riscos relacionados à importação de produtos falsificados. Tais medidas podem impactar as exportações de commodities tanto agrícolas quanto minerais do Espírito Santo para os EUA.Expansionismo fiscal Outro ponto relevante da política econômica de Trump é o possível expansionismo fiscal representado pelas suas declarações de que irá baixar impostos e aumentar estímulos à indústria nacional. Com aumento dos gastos governamentais, corte de impostos, encarecimento dos bens importados e a redução de mão de obra devido ao enrijecimento da política migratória, é possível que haja uma pressão inflacionária, o que levaria o FED (banco central americano) a manter os juros altos nos EUA. Dólar Além disso, com uma política comercial mais protecionista, a tendência é que o dólar se valorize, pressionando o real. Caso os EUA endureçam políticas monetárias ou comerciais, investidores podem retirar capital de mercados emergentes, impactando projetos de infraestrutura no Espírito Santo. Viagens mais caras Por outro lado, ele cita que com um dólar valorizado, viagens ao exterior ficam mais caras para brasileiros. Isso pode impulsionar o turismo doméstico, beneficiando destinos capixabas como Guarapari e Domingos Martins.Desigualdade de gênero Do ponto de vista político, ele diz que os discursos trumpistas contra temas da agenda social como desigualdade de gênero e discriminação racial, e sua postura xenófoba, chauvinista, machista e homofóbica tende a fortalecer grupos ao redor do mundo que se identificam com esses posicionamentos. Invasão ao capitólioPara ele, no Brasil, a repercussão do perdão aos participantes da invasão ao capitólio e a aproximação do governo de empresas donas de redes sociais que se recusam a combater a desinformação tende a fortalecer grupos políticos extremistas que se identificam como ultra liberais e opositores ao governo Lula. Isso inclusive pode influenciar a força desses grupos nas eleições nacionais de 2026 e nas alianças e na agenda política do governo federal e dos governos estaduais.Anti-imigração Com o fortalecimento da política anti-imigração, segundo ele, veremos a chegada cada vez maior de brasileiros deportados retornando ao País. Relações comerciais Com o acirramento das tensões entre BRICS (e principalmente China) e os EUA, há uma tendência natural de que o Brasil se volte ainda mais para o grupo de países emergentes liderado pela China para redirecionar suas relações comerciais, financeiras e políticas. Caso Trump aumente sanções contra a China, Pequim pode buscar novos fornecedores de commodities. O Espírito Santo pode ganhar espaço na exportação de minério de ferro e café para o mercado chinês.Empresários veem possível atração de investimentosO Sindicato do Comércio de Importação e Exportação do Espírito Santo (Sindiex) destacou que mesmo diante de incertezas globais, como as possíveis medidas protecionistas nos Estados Unidos, o Estado deve aproveitar sua posição geográfica e os incentivos fiscais para atrair investimentos, diversificar mercados e avançar ainda mais no comércio exterior. Para o Sindiex, as perspectivas para 2025 são otimistas, com previsão de continuidade no crescimento, ainda que em ritmo moderado, devido ao excelente desempenho do estado no comércio internacional em 2024, com crescimento de +27,11% no comércio exterior, em relação ao ano anterior, atingindo US$ 24,6 bilhões comercializados.O Sistema Fecomércio-ES – Sesc e Senac informou que, juntamente com a Confederação Nacional do Comércio (CNC), acompanha atentamente possíveis medidas do novo governo do presidente Trump, nos EUA, que possam impactar os setores do comércio, serviços e turismo do Espírito Santo e do Brasil, entre elas possíveis mudanças em regras tarifárias.Já a Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) seguem atentas aos anúncios feitos pela nova equipe de governo dos Estados Unidos, mas ainda é cedo para comentar possíveis impactos à indústria.